Tuesday, April 7, 2015

Peixes - Algumas técnicas para sua conservação


A conservação de alimentos sempre foi um desafio quando se tratava especificamente de peixes e frutos do mar. Antes da criação da refrigeração motora e os transportes refrigerados, era muito difícil alguém comer peixe fresco.
As técnicas de pesca se difundiam em tal escala que a quantidade de peixes pescada era tão grande que o excesso tinha de ser preservada através de técnicas de salga, secagem, defumação, fermentação ou alguma combinação destes tratamentos microbianos.
Peixes preservados são apreciados em diversas partes do mundo, especialmente na Europa e Ásia, apesar do sabor mais acentuado que os dos peixes frescos – mais consumidos aqui no Brasil e atualmente nos Estados Unidos.
Os peixes conservados, porém, não se tornam inferiores na qualidade, por isso; sendo uma opção bem interessante a ser utilizada em diversas receitas.


Peixes secos

Secar alimentos ao sol e ao vento é o método mais antigo de preservação. O peixe fresco tem cerca de 80% de água; com menos de 25% de, as bactérias têm dificuldade para se multiplicar, e o mesmo acontece com os fungos abaixo de 15%. Felizmente a desidratação intensifica e altera o sabor, pois rompe a estrutura das células e assim promove a atividade das enzimas, e por outro lado, concentra as moléculas saborosas a ponto de fazê-las começar a reagir umas com as outras e criar novas nuances de sabor.
A China e o Sudeste Asiático são os maiores produtores e consumidores de peixes e frutos do mar secos. Lá os cozinheiros usam camarões secos inteiros ou moídos para temperar vários pratos; cozinham no vapor e moem vieiras secas antes de acrescentá-las a sopas; reconstituem as carnes duras e secas de abalone, polvo, lula, água-viva, e submetem-nas a cocção lenta até ficarem macias. Fazem o mesmo com barbatanas de tubarão, que emprestam às sopas uma densidade gelatinosa.

Peixes salgados

Os europeus desenvolveram a técnica da secagem dos peixes através da salga destes. Por ser um continente de clima temperado, os peixes estragam facilmente antes de secar o suficiente; por isso a salga é o melhor método de preservação para os pescados. Um dia de salga, preserva o pescado por muitos dias mais, tempo suficiente para levá-los para o interior; ao passo que um peixe com salga de 25% o deixa estável por um ano.


Bacalhau salgado

O bacalhau a tempos é a espécie mais conhecida dentre os peixes salgados no continente europeu, onde o tratamento padrão consistia em abrir o peixe, salgá-lo e deixá-lo sobre rochas e jiraus durante várias semanas para secar. Hoje em dia, o bacalhau pode ser curado por 15 dias para saturar a carne de sal (25%) e depois, conservado sem secagem durante meses.
O bacalhau salgado continua sendo o alimento popular não só em todo o Mediterrâneo como também no caribe e na África, onde foi introduzido na época do tráfico dos escravos. A Escandinávia e o Canadá ainda são os maiores produtores. O bacalhau seco de cor branca é preferido em detrimento ao amarelo e ao avermelhado, pois as cores indicam sabores desagradáveis provocados pela oxidação ou por microorganismos.


Arenque salgado

O arenque pode ser composto de até 20% de gordura em relação ao peso e, portanto, correm risco de se tornar rançosos quando expostos ao ar. Os pescadores medievais resolveram este problema fechando os barris de salmoura, onde se conservavam por até um ano. Então por volta de 1300, os holandeses e os alemães do norte desenvolveram uma técnica rápida de limpeza das vísceras que poupava um pedaço do intestino rico em enzimas digestivas (o ceco pilórico). Durante um a quatro meses de cura em salmoura moderada (entre 16-20%), essa enzimas circulam e suplementam a atividade das enzimas dos músculos e da pele, decompondo as proteínas até criar uma textura macia, convidativa, e um sabor maravilhosamente complexo, que combina a um só tempo notas de peixe, carne e queijo. Esses arenques são comidos no estado em que se encontram, sem dessalga nem cocção.


 Anchovas curadas

As anchovas, parentes próximas do arenque, são curadas na região do Mediterrâneo, com o objetivo de fazer um molho de peixe típico da região. Tiram-se as cabeças e limpam-se os peixes, que são então postos em camadas entremeadas de sal em quantidade suficientes para saturar seus tecidos. Essa massa é prensada e conservada por seis a dez meses em temperatura relativamente alta, entre 15 e 30ºC. Os peixes podem então ser vendidos no estado em que se encontram; alternativamente, os filés são enlatados ou acondicionados em recipientes de vidro, ou moídos e misturados com óleo ou manteiga para formar uma pasta. As enzimas dos músculos, da pele, das células sanguíneas e das bactérias geram muitos compostos de sabor; a concentração destes, aliada à alta temperatura de cura, estimula os primeiros estágios das reações de escurecimento, que geram ainda outra gama de moléculas aromáticas. O resultado é um sabor extraordinariamente complexo que inclui notas de frutas, gordura, fritura, pepino, flores, doces, manteiga, carne, pipoca, cogumelos e malte. Essa complexidade concentrada, aliada ao modo com que a carne curada se funde imediatamente com os demais ingredientes de um prato, fez com que os cozinheiros tenham usado as anchovas como realçador geral de sabor em molhos e outros pratos desde o século XVI.

Referência bibliográfica: Comida e Cozinha - ciência e cultura da culinária, by Harold McGee - Ed. Martins Fontes / 2014.

No comments:

Post a Comment