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Monday, October 19, 2015

Cozinheiro - Profissão da moda



    Sabem? Não sei por que, mas tenho a impressão que ainda hoje, alguns jovens continuam procurando alguma faculdade que seja fácil de passar no “vestibular” do Enem ou do PAS. Isso me parece que existe desde anos 60, quando quem não queria ser engenheiro, médico ou advogado, escolhia letras ou artes plásticas, pois as chances de passar no vestibular eram maiores – pensavam assim alguns tolos e inexperientes vestibulandos. Depois, já no finalzinho dos anos 70, início de 80, veio a febre da tecnologia da informação, oferecendo empregos com salários generosos aos futuros programadores, mas exigindo dos mesmos, uma grande competência – tanto de conhecimento quanto de determinação – pois, nunca mais parariam de estudar. Poucos, destes inocentes deram seqüência a novidade profissional. 
    Mas falo isso, em função de um determinado assunto que tem me chamado a atenção, que é a glamourização da profissão de cozinheiro. De repente passou a ser chique ser cozinheiro; claro que não usando este nome, pois não é bem assim que os estes candidatos a cozinheiros se sentem ou se imaginam. O nome que imprime um status massageador do ego chama-se “Chef”; e para isso, é fundamental que se tenha um diploma de gastrólogo – ou seja, que tenha concluído um curso de gastronomia. Ponto. 
   Não me lembro se já escrevi isso antes, mas certamente já comentei o assunto inúmeras vezes, com diversas pessoas, principalmente com os jovens que me dizem que querem fazer faculdade de gastronomia. 
    E quando percebo a inocência como tratam do assunto, fico pensando na decepção que estão sujeitos a terem no decorrer da caminhada. Jovens que em sua maioria, não cozinharam um ovo ou se muito, fizeram alguns bolos de caixinha, resolvem aventurar-se pelo universo culinário, com a expectativa de serem chamados de “chefs”, mas sem um objetivo concreto do que fazer com esta profissão. 
   Raros são os que me dizem que querem ser proprietários de um restaurante; mas para isto não precisa ser cozinheiro, basta ter dinheiro e preferencialmente ter feito um curso de administração de empresas. Se for para ter um programa de televisão, vai ter que ter muita sorte, pois se não tiver um bom sobrenome, terá de concorrer com outros tantos e tantas que têm a mesma pretensão. Lembrando que são poucos os canais que têm em sua programação, assuntos culinários que rendem boa audiência – e é claro, já têm seus famosos e famosas por lá. 
    Mas então, o que têm fascinado estes jovens, a quererem entrar neste universo hostil? Hostil sim, pois trabalhar sobre pressão, expostos a altas temperaturas, em um lugar úmido que mais parece uma sauna; onde a disciplina e o nível de exigência é extremamente elevado; em que os horários de trabalho são longos e normalmente trabalha-se muito mais nos fins de semana; os salários para iniciantes nunca é compatível com a carga de trabalho imposta; não ficar melindrado por receber ordens aos berros; cortar-se, queimar-se, fazem parte do dia a dia deste ofício; ter a humildade de saber que é ali, que verdadeiramente se está aprendendo e naquele momento não se pode errar, como acontece nas aulas práticas da faculdade; e por aí vai!
    Não desanimem, digo eu aos que já demonstram um certo arrependimento. Ser dono de funerária, eu acho pior; mas enfim, cada um escolhe a profissão que lhe dá mais prazer ou grana, por certo. 
    Saibam também, que é essencial que se aprenda pelo menos uns dois idiomas, além do português, pois as chances aumentam e muito, tanto na obtenção de um emprego quanto na sua própria qualificação profissional. Lembrem-se que existem muitos bons livros em outros idiomas! Façam de seu estágio, um aprendizado de valor, pois assim vocês poderão ser bem vistos por quem sabe mais do que você. 
    Mas aos que escolherem esta profissão de cozinheiro, digo para não se deixarem contaminar pela vaidade do status. Ser “chef” é uma circunstância momentânea; pois ninguém é “chef” toda hora, mas será sempre um cozinheiro. Não tenha vergonha de dizer que é um cozinheiro ou uma cozinheira, isto não é uma função degradante nem desqualifica o sobrenome de sua família. Que tenham garra e determinação e que façam das tripas, coração – literalmente, para que esta profissão escolhida seja plena de satisfação e boas realizações.

Tuesday, October 14, 2014

O bom chefe é aquele que sabe ser um bom líder


Semana passada, vi rapidamente um programa na TV a cabo, onde um “chef” de cozinha, histérico, dava ordens a seus auxiliares, onde havia um disputa entre equipes. Não vi o suficiente para entender qual era a lógica do programa, mas o pouco que vi pude perceber o quanto havia de fantasia naquelas cenas.
O chefe (isto mesmo, che-fe) Gordon Ramsay, vociferava com seus auxiliares, humilhando-os e ofendendo-os, numa clara demonstração de como não se deve fazer em qualquer que seja a área profissional em que se atue. Parecendo que esta atitude é o “normal” de um bom chef, zeloso para que tudo dê certo. Pois sim....
       Já conversamos aqui a respeito do status que criou-se ao nomearem “chef” todo e qualquer cozinheiro; virou moda ser chef. Mas sabemos que a diferença entre um e outro está apenas na função que cada um exerce ao administrar seu “território” - uns administram macro, outros micro.
Por conta deste assunto, vi que a atual novela da Globo, a produção apresenta uma caricatura do que ela imagina que seja ou haja um Chef restauranteur. Parece personagem de desenho animado; sempre simpático e arrumado recebendo todos os clientes (cadê o maître do restaurante?) e ao atravessar o portal que liga o salão a cozinha, transforma-se em um sujeito mau humorado e neurótico, e até mesmo desconhecendo totalmente o que será servido no cardápio. Vira e mexe, ele pergunta ao cozinheiro chefe, o que ele “vai aprontar desta vez?”. Será que ele não conversa com seus comendados? Que não discute com eles previamente, o cardápio? Será que eles mudam de cardápio toda s emana ou todo dia, inovando ao surpreender sempre os clientes? E se algum dos clientes quiser repetir a musseline de jabá com jirimum em outro dia? Será que seria atendido?
Mas vamos voltar ao assunto que me levou a escrever este texto.
É preciso que se saiba que ser chefe (no sentido explícito da palavra) é exercer uma função (temporária ou não) que seja tão somente de cumprir regras e metas para que algo seja realizado e traga o resultado esperado. Seco assim.
Daí, porém, é comum decorrerem alguns desvios de comando, normalmente por parte do chefe. Quando a vaidade se sobrepõe a razão e a boa educação, e o que normalmente se vê, são funcionários com medo do chefe (sem respeitá-lo). O chefe vê seus funcionários como subordinados que devem seguir suas ordens da maneira que ele acha mais eficaz, sem pensar no bem-estar coletivo. Ele nunca incentiva ou motiva, já que acha que realizar um trabalho excelente é dever do funcionário e, quando isso não é visto, ele faz questão de apontar os erros. O chefe joga a responsabilidade em cima de sua equipe quando algo não dá certo e se vangloria quando um objetivo é alcançado. Ou seja, “eu estou sempre certo” e se algo não deu certo “é porque os outros erraram”. Ser desequilibrado (emocionalmente e psicologicamente) não é garantia de sucesso para ninguém.
Ser um bom Chef (e aí embarcamos em nossa praia) é tornar-se um líder. Ser alguém capaz de motivar sua equipe e fazer com ela vista a camisa literalmente, de seu restaurante ou do lugar onde todos trabalham – sempre em prol do coletivo. O Chef buscará resultados, ouvindo sua equipe e encontrando juntos, a melhor maneira de alcança-los. Deverá sempre estar disposto a experimentar o novo, sabendo que o desafio do dia a dia, está na busca de novas soluções para velhos problemas – sejam eles quais forem. Buscar em cada um de seus funcionários, o melhor de si e equalizar conhecimentos, motivando-os sempre; valorizando o que tenham de melhor, respeitando suas dificuldades e trabalhando junto com elas para que possam superá-las. E o mais importante, dividir com toda sua equipe, o sucesso dos resultados obtidos.
Então, da próxima vez que você for assistir a algum programa de competição entre cozinheiros, pense nisto que você leu e reflita. Vale a dica!

Thursday, March 22, 2012

"Errar é mais do que humano, é necessário."

 

   Visitando o blog de Roberta Sudbrack, me deparei com um texto que me fez admirá-la ainda mais. Sim. Tenho admiração por quem aprende fazer, fazendo. Por quem desmonta pra ver como é que monta. De quem do erro aprende a fazer o certo, com a consciência de que não caberá mais errar.
   Esta jovem gaúcha dispensa apresentações para quem permeia pelo mundo da gastronomia brasileira. Talentosa em seu ofício e não menos em suas lúcidas percepções reproduzidas em seus textos, Roberta nos brinda com um texto muito interessante o qual reproduzo aqui na íntegra.
   Um valioso conselho para os que estão começando neste ofício e os que imaginam que ser Chef é uma "profissão" de glamour (o que ela inteligentemente contesta). É muita ralação em todos os sentidos. É ganhar o pão (e as vezes amassar muitos), literalmente, com o suor do rosto e porque não dizer de todo o corpo!?
   Espero que este texto sirva de reflexão e que tenhamos bom proveito, ao lê-lo. Este é um dos textos que deveríamos ter colado na porta da geladeira, para todos os dias começarmos e recomeçarmos nosso aprendizado, seja em que área do conhecimento for. Pois o que importa, não é somente o que aprendemos na teoria, nos belíssimos livros de culinária, mas o que nossa experiência gravou em nossos corações e mentes.

Errar é mais do que humano, é necessário.

   Espero que nenhum dos meus cozinheiros passe por aqui hoje. Porque apesar de acreditar nessa filosofia de botequim, não posso correr esse risco com eles! Errar, se pensarmos bem, é o caminho mais próximo da sabedoria. Só errando na prática, ou seja, vivendo literalmente as dificuldades, a gente desenvolve um método muito próprio para lidar com elas no futuro. Se prestarmos bastante atenção aos detalhes que protagonizaram o erro anterior, muito provavelmente não repetiremos a cena. Seja por cautela, seja por aprendizado efetivo. Seja o que for, está valendo.
   Errar é fundamental. Aprender sem errar não tem nem a mesma graça e nem o mesmo peso. Eu, como boa perfeccionista que sou, detesto errar, para mim é igual perder no jogo de mímica, não admito! Mas com o tempo fui aprendendo o quanto é importante no processo de amadurecimento do cozinheiro e do ser humano. Antes, queria morrer. Sentava, chorava, jogava a panela inteira de arroz todo grudado no lixo. Depois respirava fundo e começava tudo de novo.
   Minha formação é autodidata até a última gota de sangue. Sangue dos dedos! Todos, um por um, já experimentaram a dor e a delícia de serem decepados. Cortava tanto os pobres coitados que o pessoal de casa chegou a pensar que aquela história não iria dar certo simplesmente porque quando eu tivesse aprendido tudo o que precisava aprender já não teria mais dedos… Eu ia para a cozinha religiosamente no mesmo horário e com a compenetração de quem vai mesmo para a faculdade. Colocava uma música ou ligava uma pequena televisão preto e branco que foi do meu avô. Isso servia para não perder o contato com o mundo, afinal, passava tantas horas na cozinha que se não fosse assim não saberia nem quando a moeda havia sido trocada. Como naquela época trocava bastante, corria o risco de chegar à feira com cruzeiro, quando as bananas já estavam sendo vendidas em cruzados. Ali eu passava horas, só na companhia do meu assistente, o adorável Júnior, meu primeiro Golden Retriever. De vez em quando eu passava correndo pela sala com a mão enrolada num pano de prato, que aos poucos ia sofrendo uma mutação na coloração original, do branco para o vermelho em segundos, coisa fantástica. Todo mundo já sabia o que havia acontecido e saia correndo atrás de mim com caixinhas e mais caixinhas de bandaids… Cada um tinha um estoque pessoal sempre à mão para me acudir nessas horas.
   Aprendi errando, essa foi a minha grande escola. Mas também jamais virava as costas ou desistia de alguma tarefa antes de pelo menos compreender que havia acontecido. Mesmo que tivesse perdido a ponta de mais de três dedos no mesmo dia. Poderia até não encontrar a sabedoria para tomar um cafezinho naquele dia. Mas no dia seguinte lá estava eu, mais cedo do que de costume na cozinha, esperando por ela. Minha obstinação é tanta que uma hora a gente acabava tomando tal cafezinho. Não sei se eu a vencia pelo cansaço ou pela obstinação… Mas seja lá o que fosse eu sempre aprendia muito.
   No dia em que finalmente consegui visualizar o processo de gelatinização de um molho demi-glace chorei de soluçar em cima dele. Muito mesmo. Podem imaginar a cena e morrer de rir de mim. Está liberado! A verdade é que só o demi-glace, o Júnior e eu sabemos o que significava aquele momento para uma cozinheira que aprendeu tudo sozinha. Outro dia conversando com um especialista em pesquisa alimentar, descobri que um dos métodos mais eficazes nesse tipo de estudo é justamente o da tentativa e erro. Ou seja, nem a ciência escapa da fabulosa possibilidade de errar. Vira e mexe me perguntam como chego a resultados tão expressivos e precisos na minha cozinha sem que ela esteja tão intimamente conectada à ciência. Ora, errando, acertando e vivendo, meu caro Watson!

   Até!

(publicado em 10.07.2011 em http://robertasudbrack.com.br/blog/)